segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Mundo sem tempo


Caminhando com passos curtos, passei pela pequena e quase deserta vila, que atraia os olhos dos tolos. Sua aparência rústica em meio à modernidade, chamava a atenção, principalmente durante à noite, que era quando mostrava sua face animadora, que parecia ser a verdadeira.
Durante o dia mostrava-se quieta, aparentando não ter nenhuma alma viva. Apenas podia-se ouvir o som de um pequeno gato, com as listras de uma zebra, que sempre pedia atenção, procurando receber algum carinho de alguém que por milagre tivesse um tempo livre. 
Nessa cidade quase não há pessoas, que tenham ao menos alguns minutos livres, todos os dias. Talvez não seja à toa, que ela se chama Anti-free. Para mim esse nome fazia muito sentido, entretanto para a grande maioria, isso não possuía significado algum. Considerava todos uns fantoches do mundo. Sentia-me uma sortuda por não precisar compartilhar o meu mundo verdadeiro.
Meus pés levaram-me para minha pequena casa, que se encontrava um tanto afastada da cidade. Nela me sentia confortável e os sons da modernidade eram quase inaldíveis. Sentada em uma deselegante poltrana esverdeada, eu esperava uma visita, que ao ver já estava atrasada fazia uma semana. Não sentia pena dessa visita, já que meu coração era mais bondoso que o de minha mãe, que já teria ido a procura de sua visita e lhe teria arrancado sua cabeça insignificante, como minha própria mãe dizia. Dava graças, por ela não estar mais morando junto a mim. Com minha insistência, me deixou vir para esse mundo sozinha, enquanto ela teve que permanecer no mundo, em que vivi durante mais de cinquenta anos. Apesar de não me sentir muito à vontade nesse mundo sem tempo, ao menos parecia uma garota de dezesseis anos. Isso me agradava muito, fazendo-me abrir um meigo e tímido sorriso, disfarçando meus objetivos com essa beleza adolescente.
Dim-dom.
Levantei-me, indo abrir a porta para minha visita.
- Olá, minha querida!
- Oi, tia. - disse com maior desânimo, que estivesse ao meu alcance, tentando não mostrar minha desconfiança.
Seus olhos se estreitaram, porém logo relaxaram.
- Como está sendo sua vida aqui?
- Boa. Mas não há muito o que fazer.
- Por que você não volta para casa?
- Ainda tenho algumas obrigações a cumprir aqui.
- Entendo.

À noite, a deixei dormindo em um dos quartos de hóspedes. Troquei de roupa e tentei sair, sem que eu a acordasse. Ao girar a maçaneta, percebi que estava como uma pedra e de forma esperada, sua elevada temperatura queimou minha mão. Já desconfiava que meu plano não daria certo.
- Aonde você pensa que vai... Filha? - minha mãe apareceu no último degrau de minha escada de madeira.
- Mãe. Você não sabe nem disfarçar. Continua sendo uma péssima atriz. Achou que eu não ia perceber? - perguntei com um intenso sarcasmo.
- Corta! Está perfeito. - disse um homem, que estava segurando uma câmera, em uma das janelas da sala.
Uma expressão de profunda incredulidade dominou-me.
- Te peguei. - disse minha mãe, entre risos medonhos. - Achou que dessa vez você iria me pegar?
Não acreditei no que vi. Fui enganada por minha própria mãe. Pensei que como sempre, ela iria tentar me levar de volta ao nosso mundo, mas fui completamente enganada. Sem lutas, sem absolutamente nada.
- Minha querida, achei o quarto muito confortável. Você não se sentirá mais sozinha. Não é mesmo, senhor Gad? - seus olhos caíram para o homem com a câmera, que em poucos segundos, se transformou no gato com listras de zebra.
Pensei comigo mesma: pobre gato sem tempo.

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